Mulheres que atuam no mercado de trabalho podem ser impactadas positivamente, pois a desoneração das empresas pode influenciar na minimização da discriminação que ainda ocorre em diversos setores
O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei 8.212/1991) que instituíam a cobrança da contribuição previdenciária patronal sobre o salário-maternidade.
Ganham as empresas, ganham as trabalhadoras. Isso porque a decisão contribuirá para a desoneração das folhas de pagamento das empresas e representará um incentivo maior para a contratação de mulheres num mercado de trabalho ainda discriminatório.
A decisão, por maioria de votos, foi tomada no Recurso Extraordinário (RE) 576967, com repercussão geral reconhecida (Tema 72), julgado na sessão virtual encerrada em 4/8. A decisão servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 6970 processos semelhantes sobrestados em outros tribunais.
O recurso foi interposto pelo Hospital Vita Batel S/A, de Curitiba (PR), com o argumento de que o salário-maternidade não pode ser considerado como remuneração para fins de tributação, pois, no período em que o recebe, a empregada está afastada do trabalho. A empresa sustentava que a utilização da parcela na base de cálculo para fins de cobrança previdenciária caracterizaria fonte de custeio para a seguridade social não prevista em lei. A União, por outro lado, alegava que a empregada continua a fazer parte da folha de salários mesmo durante o afastamento e que, pela lei, o salário-maternidade é considerado salário de contribuição.
Em sua decisão, o ministro Luiz Roberto Barroso destacou diversas pesquisas que demonstram a reiterada discriminação das mulheres no mercado de trabalho, com restrições ao acesso a determinados postos de trabalho, salários e oportunidades. Na opinião de Lara Regina Hesselbach, diretora de Recursos Humanos da Hesselbach Company, este era um problema comum em muitas empresas, que temiam contratar mulheres por conta dos períodos de gravidez.
As mulheres são maioria da população no Brasil. Vivem mais tempo, têm mais educação formal e ocupam 44% das vagas de emprego registradas no país. No entanto, mulheres recebem, em média, 20% menos que os homens. E apesar de serem 55% dos estudantes universitários e 53% do total dos alunos de pós-graduação, ocupam apenas 13% dos cargos de presidência.
A Hesselbach é uma empresa que trabalha com soluções em consultoria e terceirização de mão de obra qualificada nas áreas fiscal, contábil, financeira e administrativa de empresas de médio e grande porte, nacionais e internacionais. E, segundo Lara, em 25 anos de existência nunca aderiu ou defendeu qualquer tipo de discriminação contra a presença feminina na empresa. Pelo contrário, a maioria do quadro de colaboradores é formada por mulheres.
“De fato, várias pesquisas apontam a discriminação da mulher no mercado de trabalho; principalmente para aquelas que almejam cargos de alta liderança dentro de uma empresa. Dentro da Hesselbach Company, porém, não existe essa discriminação. Estamos sempre em busca de uma nova era dos Direitos Trabalhistas, com salários igualitários, conduta e respeito não importando o gênero do profissional. Hoje posso afirmar que na nossa empresa 56% do quadro de funcionários são profissionais do sexo feminino”.
Estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmam um crescimento acentuado da participação da mulher no mercado de trabalho nos últimos 50 anos. Menos de 14% das mulheres tinha emprego nos anos 1950, e o último censo (2010) mostra que esse número passou para 49,9%. No Brasil, o Ministério do Trabalho aponta um salto na ocupação feminina em postos de trabalho de 40,8% em 2007 para 44% em 2016. Apesar do avanço, esse dado não condiz com o percentual de mulheres na população brasileira que segundo o IBGE é de 51,03%.
O trabalho “Estatísticas de Gênero: indicadores sociais das Mulheres no Brasil”, também realizado pelo IBGE, diz que as mulheres trabalham em média três horas por semana a mais que os homens, considerando trabalho remunerado, atividades domésticas e cuidados com pessoas. E mesmo com um nível educacional mais alto e mais qualificação, elas ganham em média 76% do rendimento pago aos homens.
“Sobre as empresas que antes acabavam aderindo a uma visão discriminatória com relação à contratação de mulheres, acredito que a decisão do STF possa atenuar essa dinâmica, pois antes elas enxergavam que a contratação de profissionais do sexo feminino aumentava o custo da tributação. Não havendo mais esse custo, talvez isso possa amenizar a visão dos empregadores. Mas ainda existe o fator do afastamento temporário no qual, dependendo do nível da vaga, ainda obriga as empresas a terem um backup de profissionais nesse período”.
Contribuição patronal sobre salário maternidade é inconstitucionalNo entendimento de Lara, é mesmo inconstitucional cobrar a contribuição patronal sobre o salário maternidade, pois ele não deve ser considerado como remuneração, uma vez que a empregada está afastada de suas atividades. Quando ocorre esse afastamento, não há a contra-prestação laboral, ou seja, não é uma remuneração porque não é decorrente de uma atividade laboral. Por isso, entende-se que os requisitos não estavam preenchidos para ele ser reconhecido como base de cálculo para custear a previdência social.
Do ponto de vista processual, será necessário aguardar a publicação do acórdão, ou seja, aguardar o relatório final de toda a discussão, porque existe a possibilidade da Receita Federal do Brasil entrar com embargos de declaração solicitando ao STF que se faça a “modulação dos efeitos” isto é, que o STF se pronuncie a partir de quando estará valendo essa nova interpretação e, se possível, que não haja a devolução dos últimos cinco anos. Dessa forma, as empresas precisarão aguardar a decisão. Embora o direito já estar garantido.
“Nossa recomendação às empresas é que acionem seus departamentos jurídicos e impetrem o Mandado de Segurança para que seja feita essa compensação, após o transito em julgado. Para assegurar o direito dos últimos 5 anos de volta do que foi pago a mais, através de uma liminar. E a partir dessa data, já ajustar as folhas de pagamento sem a incidência patronal”, avisa.
Diretor Fiscal da Hesselbach Company, Luiz Wanderlei de Souza endossa a recomendação de Lara. Ele aponta que algumas empresas não questionaram a cobrança do INSS sobre o salário maternidade, junto ao Poder Judiciário, porque ainda não havia uma decisão pacificada.
“A Hesselbach tem experiência na recuperação dos valores de INSS pagos nos últimos cinco anos sobre o salário maternidade. Com essa decisão, agora pacificada pelo STJ, sabemos que qualquer nova ação impetrada será favorável.
E o montante pago nos últimos cinco anos podem ser recuperados com juros e, em relação ao futuro, não será devido. Dessa maneira, as empresas podem ganhar, realizar caixa, de duas formas. A primeira, recuperando o passado, as contribuições que foram pagas indevidamente, compensando com o INSS atual devido. E a segunda, deixando de pagar a contribuição futura de INSS sobre o salário maternidade”, conclui o executivo.